O Homem do Futuro

Eis que o futuro se fez presente
como o pão amanhecido no armário,
tornando-me um semblante duro
vagando entre as nuvens do aquário.
O mar permanece um reino distante,
imerso num grande quadro obscuro
de um passado de retratos nublados.

No futuro, abandonei o passado
de sonhos, de desejos, de anseios.
Sou o horizonte daquela escuridão
vislumbrando o reflexo abandonado.
Nunca houveram parques ou passeios
para um porco afogado em solidão.

No futuro, no futuro, no futuro!
Quanto tempo pelo amanhã?
Para quê? Por quê? Por quem?
Um destino morto e enterrado,
um presente opaco e perdido!
Era um afã, um órfão pela manhã
esperando o abraço de ninguém.

Não há erros dos quais me arrepender!
Da esquizofrenia virtual de minha mente, costurei a mentira da qual me fiz capaz
e guardei a história das memórias do talvez!
Sonhei sonho após sonho, dia após dia.
Vivendo mil outras vidas nunca vividas
num inconstante caminhar à revelia.

Hoje sou o futuro que passou do tempo,
a validade que venceu sem nem amar.
Sou o amanhã que sempre temi ser:
uma tarde vermelha perdida no sol.
Teclado empoeirado por não dizer.

Esperei tanto a vida dos humanos
que enferrujei por baixo do lençol
ao ponto de não poder contar em anos.